sábado, 12 de junho de 2010

Aconteceu...almoçar feijão frade com atum e matemática

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Feijão frade de lata com atum enlatado, durante anos nem conseguia pensar em comer isto. Reportava-me para a comida de férias, passeios a pé, picnic e camping, que com gosto mas sobretudo por necessidade, se comia nas passeatas pelo estrangeiro já com 2 filhos e dinheiro contado.
Um dia a passear a pé pelos Picos da Europa? Latas de feijão frade e de atum. Uns dias na Galiza? Latas de feijão frade e atum. E assim por diante.
Na casa dos meus pais comia-se feijão frade, quentinho com cebola e salsa picada como acompanhamento de pasteis de bacalhau. Ou usando uma linguagem mais nortenha, chícaros com bolinhos de bacalhau.
Pois hoje, e depois de falhado outro menu, foi o daquelas férias que comi. E soube-me muito bem, coisa que ainda há poucos anos me daria enjoo só de pensar.
A memória não é uma coisa estática, como sabemos, e o facto de estar ligada a emoções, dá-lhe uma grande mobilidade. O tempo pode até alterar as nossas memórias afectivas, ao dar-lhes outras tonalidades, permitindo outras leituras.
Mas, enquanto comia li no Expresso a crónica sempre tão interessante do matemático Nuno Crato. Escreveu ele sobre o tipo de movimento organizado que os peixes predadores como o atum têm quando procuram alimento. Movimento este que é diferente conforme há muita caça - movimento browniano - ou pouca -modelo de Lévy. Ou seja, movimentos organizados e estudados pela matemática e que ele, como é costume, traduz em linguagem aparentemente simples.
O atum que comi fez ligar duas partes essenciais de mim, a parte afectiva e a parte racional. Foi uma refeição completa!

1 comentário:

  1. Ora aí está!
    Assim é que é escrever...
    Contaste os feijões? Ri-me ao contares da lata de feijão. Como tu, um dia fomos acampar para uma Lagoa da nossa costa Vicentina,(a qual antes, nunca tal se chamara)não havia pontes para a travessia da foz dos rios e, alugávamos sempre um simples barco de pescador.A Dyane não era anfíbia, apesar da grande carga que suportava para além das latas de muitos feijões. Como sabes, nessa época sem apresentar o fanatismo moderno fui longos anos vegetariana. De facto as latas eram proíbidas no regime alimentar, mas tinha uma grande amiga que me dizia:« houve alguém que um dia, abriu uma lata dessas-aquela era de grão-comeu-a e depois morreu!»...passados uns dias fiz um almoço junto às dunas, no nosso selvagem espaço e modo de acampar e foi um regalo comer o grão também com a salsa,os coentros, o alho com os ovos cozidos a ver o mar. Estava grávida e a ler A Peste do Camus. Embora sempre me tivessem dito que à mesa não se lê. Mas estava à mesa das dunas, com o mar pela frente. Ninguém morreu,felizmente até hoje, por isso. Esses movimentos dos peixes aprendi com uma das minhas filhas. Aquela que nunca acreditaste que salvaste (não da intoxicação da lata). O Nuno Crato é um poema d'homem a ensinar também. Adoro os fractais e essas marítimas vidas contadas. Como deixámos de contar os feijões.Na transição e trasmutação do afecto é que se encontra a côr e o sabor estético da vida humana. As histórias da Jacarandá, pela qual temos de esperar tanto tempo, por aquele anilado- intensa mistura de azul com vermelho. E, tal como tu em Loulé-no espanto do olhar vibrante como alerta, ando quase sempre assim no meu mais sensível estado de ser.Tocam-nos as côres e as formas pelo encanto de nos conterem e suportarem.

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