domingo, 28 de fevereiro de 2021

Encontros de café, fazem-me falta

 346º dia do recomeço do blog

Na mesma avenida do Liceu Francês havia lá mais à frente, esquina com a Artilharia 1, um café/pastelaria chamado Sol Parque. Nesta mesma rua ficavam mais dois colégios, o Colégio Maristas de Lisboa e o Externato do Parque. Não me lembro de nos termos juntado por ali.

O Sol Parque era o espaço onde os meus amigos e eu nos encontrávamos quando tínhamos mais tempo. Um café/pastelaria amplo, com um empregado muito simpático que já nos conhecia a todos. 

É maravilhoso relembrar como tínhamos sempre prazer em conversar! Tinha um grupo interessante, activo culturalmente, quer no teatro, quer na música, quer na política numa altura muito antes do 25 de Abril. 

Uma referência ao meu primo Pedro, sete anos mais novo que eu e que já morreu. Na altura era aluno dos Maristas e no Sol Parque orgulhoso da prima mais velha, pedia sempre para pôr as suas despesas na minha conta.

Nunca mais fui frequentadora de cafés, nem nunca mais tive um grupo que se encontrasse nalgum. Pena!

sábado, 27 de fevereiro de 2021

Concursos de rapidez a comer bolos.

  345º dia do recomeço do blog

Morava em Campolide e ia todos os dias a pé para o Liceu Francês. Distância curta. Em pequena ia com o meu Pai de mão dada até à porta. Depois começou a deixar-me na esquina. E mais tarde ia sozinha, mas quase sempre acompanhada por dois colegas que também moravam para ali.

Em adolescente, não sei com que idade, íamos sempre mais cedo e parávamos naquilo a que chamávamos leitaria. Um pequeno espaço, paredes de azulejos brancos, um balcão e umas mesas.

Encontrávamos ali grande parte da turma. Se calhar um pastel de nata, ainda não bebia bica diária mas fumava cigarros. Fazíamos um pequeno ajuntamento fardado, eles de calças cinzentas e camisa azul clara e blazer azul escuro, nós, as raparigas semelhante mas com saias. Umas conversas ou melhor trocas de frases e lá íamos para as aulas que começavam às 8h da manhã. 

Também se comia lá, raramente mas lembro-me de um ou outro almoço que combinávamos. E na galhofa fazíamos uns concursos, ver quem comia mais rapidamente um pudim flan ou noutros dias um bolo de arroz. Ambos com técnicas diferentes. 

O pudim era mesmo de forma inestéctica, prato junto à boca, pudim junto à boca e aspirava-se todo de uma vez. Por acaso nunca nenhum se engasgou. 

O bolo de arroz, pelo contrário, era comido aos bocadinhos pequenos, retirados do bolo com a mão que os levava à boca. Quem comia às dentadas embuchava, não conseguia engolir e como o concurso era de velocidade, perdia.

Não me lembro quem tinha mais perícia para ganhar. 

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2021

Uma vergonha passageira

 344º dia do recomeço do blog

Hoje ouvi falar do cinema de Campolide de que não me lembro mas que ficava ao pé do mercado. Esse sim, descendo a rua quase a pique ficava do lado esquerdo. Era pequeno. Dito na minha dimensão de criança. 

Entrei para o Lycée Français aos quatro anos. Por isso esta minha recordação foi antes dessa data ou nalgum dia sem aulas.

Já falei várias vezes na minha Mãe, super educada e discreta.

Uma manhã fui com a empregada (antigamente chamada criada) ao mercado. Na zona do peixe, uma peixeira exuberante no tom de voz e chamamento das clientes, estava cheia de ouro. Brincos vistosos, cordões de ouro, anéis, aquilo que o meu Pai chamaria uma ourivesaria ambulante. Certamente me chamou, quem sabe se cantou, seguramente me encantou.

E devo ter dito qualquer coisa como "gostava que fosse minha Mãe", que a criada transmitiu à minha Mãe.

A minha Mãe, a senhora sóbria, discretamente perfumada e enfeitada, não sei o que sentiu mas lembro-me do que me disse "e gostavas que eu chegasse a casa a cheirar a peixe?".

Não, não me traumatizou mas envergonhou-me. Tanta coisa que dizemos e que quem ouve deve calar. Mas a rapariga, não me lembro de qual, deu com a língua nos dentes. Vai na volta também ela gostou do festival da peixeira.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Para fantasiar não é preciso ver com os olhos.

 343º dia do recomeço do blog

Está a ficar mais escuro, nuvens cinzentas começam a tapar o céu azul.

Lembro-me com a minha Mãe de fazer um jogo de fantasia, certamente no verão porque estávamos deitadas no chão. 

Olhávamos então para as nuvens brancas do céu e imaginávamos formas conhecidas. Muitas vezes de animais e até dinossauros voadores. Era muito divertido e riamos imenso. Muitas vezes tínhamos de explicar a forma que nos tinha motivado e se havia vento as nuvens mudavam rapidamente de forma.

Ela de vez em quando dava um grito de prazer e exclamava, olha, olha, estou a ser puxada. Uma espécie de sucção que o céu exercia sobre ela mas nunca o fazia a mim. Tirando a identificação das formas não me permitia mais nada.

Um dia numa consulta um miúdo falou-me neste jogo das nuvens. Que fazia com o avô, ele tinha-lhe ensinado isso e ele tinha gostado muito. Conhecedora da família, sabia que ele já só tinha um avô, com quem passava muitas tardes. Só que o avô era cego, não de nascença mas há já muitos anos.

Fiquei emocionada na altura. Foi quase como ter acabado de ouvir um poema bonito.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

O pensamento em demasia inibe a acção

 342º dia do recomeço do blog

Em 1980 fiz o meu Serviço Médica à Periferia no Distrito de Viseu, bem ao norte do mesmo. Já falei disto várias vezes mas vou agora juntar mais qualquer coisa.

Inicialmente foi muito difícil. Depois a integração no trabalho e nas populações, o ter arranjado amig@s, veio facilitar as coisas. Foram um ano e uns dias e mantenho a melhor das experiências da minha vida.

Mas de vez em quando as saudades do meu ambiente habitual, Lisboa, Sesimbra, Rio Tejo e Mar batiam forte. Ali no interior não havia isso, só muitos kms de más estradas me poderiam levar aos "meus" sítios.

Ia então ao fim do dia para a Barragem do Vilar, bem ao perto. Ouvia as rãs, atirava umas pedras para ouvir o barulho da água a mexer e voltava mais consolada.


Ontem estava mesmo em baixo. E hoje levantei-me com uma ideia que me animou, vou passear para ao pé do Rio Tejo. Arranjei-me, pronta para sair quando recebi um telefonema de uma amiga que me disse ter tentado e a polícia ter impedido. Para além do mais é 
proibido passear no passeio junto ao rio.

Fiquei caída. E comecei a magicar que se apanhasse o metro até à Praça do Comércio veria o rio. Ia conseguir chegar lá e fazer a pé até ao Cais do Sodré, como se fosse apanhar um comboio?

Quando se age depressa não se pensa muito, quando se pensa demais pode acontecer que já não se age.

Foi o que me aconteceu, fiquei pelo bairro a ler as ementas dos almoços e vim para casa comer restos que cá estavam e estavam muito bons.

Talvez um destes dias pense menos...

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Era uma vez o coro, para já.

 341º dia do recomeço do blog

Não tenho conseguido treinar a partitura de Mozart. A música é linda, mas quando dou por mim, estive ocupada com outra coisa e quase só à hora de deitar me lembro que não a estudei. Tarde demais.

No dia a seguir acontece-me a mesma coisa. Mais um dia sem estudar.

No início dos ensaios por ZOOM divertia-me. Foram os reencontros e muitas vocalizes. Depois começaram umas músicas que foram razoavelmente fáceis porque conhecidas, até cantadas pelo Louis Amstrong. Estavam no ouvido.

Até me ofereci para cantar para todos, eu de microfone aberto, os outros com os deles desligados. Julgo que foi a primeira vez que a maestrina me ouviu cantar e até elogiou. Sim, sei que me saí bem mas não tenho a voz sempre assim.

E depois há a porcaria da memória, esqueço-me da sequência da música, a letra tenho-a à frente. As notas também lá estão mas não os sons.

A isto junta-se o meu estado de humor, uma quase anedonia. Passa quando agarro num livro e leio sem parar. 

Enviei um mail e despedi-me por uns tempos. Não expliquei a razão, só falei na minha ausência e um eventual interregno.

Sei, para além do confinamento, o que me trás assim. Vamos a ver o que se segue.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Há vários tipos de memórias e há o esquecimento

 340º dia do recomeço do blog


" Os mortos são objectos que se estragaram, como um televisor, um rádio, a batedeira eléctrica, e o melhor é lembrarmo-nos deles como eram quando funcionavam, porque o único túmulo aceitável é a recordação".
Elena Ferrante in A Vida Mentirosa Dos Adultos

 
Uma frase, um pensamento chocante. Por ser seco, frio e pragmático. Mas fiquei a pensar.

Tanto mais quanto a minha primeira chefe desde o final dos anos 80 até 2000, me pediu uma informação para situar um artigo da minha Mãe.

Não tinha a revista científica onde foi publicado mas uma colega amiga enviou-me as fotos da capa, Conselho de Redacção e Índice.

E aqui começam as memórias. Ainda bem que a minha Mãe publicou aquele artigo que vai ter nova vida. Deixar escritos é uma forma de permanecermos para lá dos netos, da memória dos netos.

Agora a outra memória, ou melhor da falta dela. Constatei que fiz parte do Conselho de Redacção. Mas nunca mais me tinha lembrado disso. E mesmo para os currículos que tive de fazer para prestar provas na carreira hospitalar referi o "posto". Nunca tive jeito para me valorizar.