quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Para fantasiar não é preciso ver com os olhos.

 343º dia do recomeço do blog

Está a ficar mais escuro, nuvens cinzentas começam a tapar o céu azul.

Lembro-me com a minha Mãe de fazer um jogo de fantasia, certamente no verão porque estávamos deitadas no chão. 

Olhávamos então para as nuvens brancas do céu e imaginávamos formas conhecidas. Muitas vezes de animais e até dinossauros voadores. Era muito divertido e riamos imenso. Muitas vezes tínhamos de explicar a forma que nos tinha motivado e se havia vento as nuvens mudavam rapidamente de forma.

Ela de vez em quando dava um grito de prazer e exclamava, olha, olha, estou a ser puxada. Uma espécie de sucção que o céu exercia sobre ela mas nunca o fazia a mim. Tirando a identificação das formas não me permitia mais nada.

Um dia numa consulta um miúdo falou-me neste jogo das nuvens. Que fazia com o avô, ele tinha-lhe ensinado isso e ele tinha gostado muito. Conhecedora da família, sabia que ele já só tinha um avô, com quem passava muitas tardes. Só que o avô era cego, não de nascença mas há já muitos anos.

Fiquei emocionada na altura. Foi quase como ter acabado de ouvir um poema bonito.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

O pensamento em demasia inibe a acção

 342º dia do recomeço do blog

Em 1980 fiz o meu Serviço Médica à Periferia no Distrito de Viseu, bem ao norte do mesmo. Já falei disto várias vezes mas vou agora juntar mais qualquer coisa.

Inicialmente foi muito difícil. Depois a integração no trabalho e nas populações, o ter arranjado amig@s, veio facilitar as coisas. Foram um ano e uns dias e mantenho a melhor das experiências da minha vida.

Mas de vez em quando as saudades do meu ambiente habitual, Lisboa, Sesimbra, Rio Tejo e Mar batiam forte. Ali no interior não havia isso, só muitos kms de más estradas me poderiam levar aos "meus" sítios.

Ia então ao fim do dia para a Barragem do Vilar, bem ao perto. Ouvia as rãs, atirava umas pedras para ouvir o barulho da água a mexer e voltava mais consolada.


Ontem estava mesmo em baixo. E hoje levantei-me com uma ideia que me animou, vou passear para ao pé do Rio Tejo. Arranjei-me, pronta para sair quando recebi um telefonema de uma amiga que me disse ter tentado e a polícia ter impedido. Para além do mais é 
proibido passear no passeio junto ao rio.

Fiquei caída. E comecei a magicar que se apanhasse o metro até à Praça do Comércio veria o rio. Ia conseguir chegar lá e fazer a pé até ao Cais do Sodré, como se fosse apanhar um comboio?

Quando se age depressa não se pensa muito, quando se pensa demais pode acontecer que já não se age.

Foi o que me aconteceu, fiquei pelo bairro a ler as ementas dos almoços e vim para casa comer restos que cá estavam e estavam muito bons.

Talvez um destes dias pense menos...

terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Era uma vez o coro, para já.

 341º dia do recomeço do blog

Não tenho conseguido treinar a partitura de Mozart. A música é linda, mas quando dou por mim, estive ocupada com outra coisa e quase só à hora de deitar me lembro que não a estudei. Tarde demais.

No dia a seguir acontece-me a mesma coisa. Mais um dia sem estudar.

No início dos ensaios por ZOOM divertia-me. Foram os reencontros e muitas vocalizes. Depois começaram umas músicas que foram razoavelmente fáceis porque conhecidas, até cantadas pelo Louis Amstrong. Estavam no ouvido.

Até me ofereci para cantar para todos, eu de microfone aberto, os outros com os deles desligados. Julgo que foi a primeira vez que a maestrina me ouviu cantar e até elogiou. Sim, sei que me saí bem mas não tenho a voz sempre assim.

E depois há a porcaria da memória, esqueço-me da sequência da música, a letra tenho-a à frente. As notas também lá estão mas não os sons.

A isto junta-se o meu estado de humor, uma quase anedonia. Passa quando agarro num livro e leio sem parar. 

Enviei um mail e despedi-me por uns tempos. Não expliquei a razão, só falei na minha ausência e um eventual interregno.

Sei, para além do confinamento, o que me trás assim. Vamos a ver o que se segue.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2021

Há vários tipos de memórias e há o esquecimento

 340º dia do recomeço do blog


" Os mortos são objectos que se estragaram, como um televisor, um rádio, a batedeira eléctrica, e o melhor é lembrarmo-nos deles como eram quando funcionavam, porque o único túmulo aceitável é a recordação".
Elena Ferrante in A Vida Mentirosa Dos Adultos

 
Uma frase, um pensamento chocante. Por ser seco, frio e pragmático. Mas fiquei a pensar.

Tanto mais quanto a minha primeira chefe desde o final dos anos 80 até 2000, me pediu uma informação para situar um artigo da minha Mãe.

Não tinha a revista científica onde foi publicado mas uma colega amiga enviou-me as fotos da capa, Conselho de Redacção e Índice.

E aqui começam as memórias. Ainda bem que a minha Mãe publicou aquele artigo que vai ter nova vida. Deixar escritos é uma forma de permanecermos para lá dos netos, da memória dos netos.

Agora a outra memória, ou melhor da falta dela. Constatei que fiz parte do Conselho de Redacção. Mas nunca mais me tinha lembrado disso. E mesmo para os currículos que tive de fazer para prestar provas na carreira hospitalar referi o "posto". Nunca tive jeito para me valorizar.

domingo, 21 de fevereiro de 2021

Jantar de domingo

 339º dia do recomeço do blog

Há pouco ao telefone o meu filho mais velho dizia que já não nos víamos desde o dia anterior ao confinamento. À mesa estava o meu filho mais novo que na próxima semana muda para uma casa mais adaptada aos cães que ele e a Inês têm.

Fico com ambos os filhos a morarem em concelhos diferentes do meu. Se o confinamento continuasse só os poderia ver de semana. Mas como se todos trabalham? Possível mas mais difícil.

Tem alguma comparação com os Pais dos filhos que emigram para outros países, às vezes separados por  muitos kms e muitas horas?

Sem trânsito um fica a 15, o outro a 40 minutos.

Voltámos a falar disto hoje ao jantar. Para nos habituarmos, talvez mais eu. Embora se passem dias sem nos encontrarmos, se isso acontece é quando vão passear os cães, somos muito independentes.

Uma coisa nos une, a mesma empregada que há 40 anos a servir-nos, uns dias a mim outros aos meus filhos que ajudou a criar, vai deixar de ser esse laço. Já disse que desta vez não os acompanha. 

É pena que não possam ficar mais perto, mas os preços determinam algumas opções.

sábado, 20 de fevereiro de 2021

Café Society para finalizar

 338º dia do recomeço do blog

Choveu todo o dia. As gotas escorriam pelas vidraças das minhas janelas. Não oiço a chuva porque os vidros duplos não deixam mas pus-me a pensar na música da Sylvie Vartan, êxito nos anos 60. 

J´écoute en soupirant la pluis qui ruisselle
Frappan doucement sur mes carreaux
Comme des milliers de larmes qui me rappelle
Que je suis seule en l´attendant.

E lembrar às vezes é como as cerejas, atrás de uma memória vem outra, o Teatro Monumental onde a fui ver duas vezes, como eu cheiinha e sem toque atrativo, pensava eu , olhava para ela como um modelo desejado.

E o então marido dela, o roqueiro em francês Johnny Halliday, que também vi no mesmo teatro. Fiquei a conhecê-lo quando a minha Mãe entrou em casa com um 45 rotações acabado de sair.

Daí para o Youtube foi uma parte da tarde, a ver, ouvir, entrevistas deles e o filho, que eu nem sabia que existia, um pouco da biografia, dos países de origem, enfim, umas horas em que não costumo perder tempo. Mas soube-me bem.

Acabei a noite a ver mais um filme do Woody Allen, Café Society. São sempre os mesmos temas, as quase mesmas músicas, mas diverti-me imenso. 

Brilhante a do judeu que foi condenado a morrer na cadeira eléctrica e que se converte ao catolicismo porque para os judeus não há vida para lá da morte.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

Feelgood? Às vezes, tem dia, tem horas.

 337º dia do recomeço do blog

Max Jacobson foi médico de muitas personalidades inclusive do futuro presidente dos EUA John Kennedy. Conhecido como Doctor Feelgood, era o médico que dava felicidade. Dominava bem as drogas, nomeadamente  anfetaminas e drogava os pacientes por forma a dar-lhes força, ânimo e confiança neles próprios.

Muitos dos seus doentes ficaram adictos. Na altura ainda não estava regulamentado o seu uso.

Ontem precisaria eu de um Doctor Feelgood? 

Não, neste estado de pandemia com as dúvidas quanto ao futuro, sem perspectivas quanto ao final, isolada de relações, isto que tive ontem tem de ser considerado normal. Hoje tão atenta estive a ler até ao fim do livro, interessada e deliciada. A leitura, quando se consegue ficar preso é uma muito boa solução.