terça-feira, 21 de dezembro de 2010

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Poema - Helder Moura Pereira

.
Cheguei a ter medo de te perder,
Tu não chegaste a ter medo.
Este silêncio de já não termos palavras
Ouve-se nas outras palavras que trocamos.
.
Miserável mundo nosso e alheio,
Igual ao que todos disseram da sua época,
E pior, porque este vivemos nós
E conhecemos nós, cada um conforme pode.
.
Já morreram os ídolos da infância
E os da adolescência vão a caminho,
Sobrevivente é o teu olhar cego
(hoje já só há um dos Righteous Brothers).
.
Na feira de velharias uma caixa
Para tabaco com uma rosa verde.
Tem o preço ainda em escudos, uma falha
Num dos cantos, uma pequena cruz de cal.
.
Permaneces aí, à lareira, lendo livros vivos
E o seu turbilhão de palavras profundas.
Nunca mais chega o medo de nos perdermos,
Eco um do outro em ricochete de silêncio.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Aconteceu...relações de proximidade

.
Esta cena passou-se num bairro de Lisboa onde ainda muita gente se conhece. Num supermercado com espírito e tamanho de mercearia.
.
Sábado à tarde, muita gente faz as compras de fim-de-semana. A fila para pagar é grande. Falam entre si.
Olhe, falta um euro e vinte, diz a caixa para uma rapariga brasileira de criança ao colo que, mesmo sem haver caixa especial, todos a deixaram passar à frente. Um euro e vinte, repete a rapariga, sim, traz-me quando cá vier, fica cá o talão, e à frente dela escreve no talão que guarda na gaveta da caixa registadora. Não é bem vender fiado, mas faz-se um jeitinho quando falta um bocadinho. Obrigada, depois trago, diz a rapariga que sai carregada de criança que já trazia e os sacos que agora arranjou.
De repente a porta abre-se, entra uma mulher que diz "Vejam lá isto, para que é que eu fui ao cabeleireiro, e apanho com esta chuva logo à saída!?
Tirasse a cabeleira! diz bem alto e dirigindo-se a ela uma senhora que está na fila, assim não a molhava e em casa punha-a. Risos vários.
Venho cá a ver se me emprestam um guarda-chuva, haverá por aí algum?
Há para aí muitos sacos de plástico, diz outra, ponha um na cabeça!
Ora, e mostra um que tem na mão, isso deu-me a cabeleireira. Mas não haverá por aqui algum guarda-chuva a mais?
Vá lá dentro ver, diz a menina da registadora, vá lá à casa de banho, talvez haja um a mais.
E o seu netinho, deve estar grande, nunca mais o vi por aqui, diz-me a menina da caixa quando chega a minha vez. Lá lhe dou notícias, pergunto pela filha dela, adeus até à próxima, e lá vou debaixo de chuva com o carapuço de anorak na cabeça.
.
Este diálogo vivo, nunca poderia acontecer num hipermercado. Os produtos serão um pouco mais baratos, aceito, mas o aspecto humano que se vive por aqui tem o seu preço.
O anonimato e a indiferencia são factores de risco para a saúde mental. Estar contido em qualquer coisa, identificar-se, fazer corpo com, como numa pequena aldeia, é uma sorte que se pode ter!

sábado, 18 de dezembro de 2010

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Poema - Adília Lopes

.
OS PAPELOTES
.
Nunca choraremos bastante
termos querido ser belas
à viva força
eu quis ser bela
e julguei que para ser bela
bastava usar canudos
pedi para me fazerem canudos
com um ferro de frisar e papelotes
puxaram-me muito pelos cabelos
eu gritei
disseram-me para ser bela
é preciso sofrer
depois o cabelo queimou-se
não voltou a crescer
tive de passar a andar com uma peruca
para ser bela é preciso sofrer
mas sofrer não nos faz forçosamente belas
um sofrimento não implica como consequência
uma recompensa
uma dor de dentes pode comover a nossa mãe
que para nos consolar sem saber de quê
nos dá um rebuçado
mas o rebuçado ainda nos faz doer mais os dentes
a consequência de um sofrimento
pode ser outro sofrimento
a causa é posterior ao efeito
o motivo do sofrimento é uma das consequências
do sofrimento
os papelotes são uma consequência da peruca

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Aconteceu...tanta electrónica, bolas!

.
Apesar da crise, li que os pagamentos feitos com os cartões de plástico mantêm valores altos.
As lojas parecem bastante vazias, mas os terminais não se devem enganar.
.
Vejo crianças com brinquedos caríssimos, em famílias que certamente têm dificuldades. A sociedade de consumo e os sentimentos de inferioridade "obrigam" a estas "necessidades".
.
Está a haver uma dificuldade de se criar brinquedos com as coisas simples que nos rodeiam. Estão desprezados face aos electrónicos. Mas não haverá lugar para todos?
As caricas que faziam de automóveis, e competiam em pistas feitas na terra, as bonecas feitas de trapos que eram tratadas com tanto desvelo como a mais sofisticada Barbie, as espadas feitas de bocados de madeira, caixinhas, molas de roupa, restos de objectos transformados e com os quais um mundo de fantasia era criado, e tantas outras coisas, não preenchiam e divertiam tanto?
.
Em certas famílias parece haver uma diminuição do relacionamento e da criatividade. Os jogos que uniam e divertiam as famílias, juntando várias gerações, parecem estar esquecidos. Muitas famílias brincam pouco ou nada com os filhos, as conversas deixam de se fazer, algumas passam os serões e os fins-de-semana agarrados à televisão, e última das minhas descobertas, famílias em que há um computador por pessoa e que estando na mesma casa falam entre si por Messenger!
.
Era bom que neste Natal, as famílias pudessem inventar com os filhos qualquer coisa que os junte sem máquinas, descobrir dentro de cada um e em conjunto as potencialidades escondidas, hoje tapadas pela tecnologia.
Gastava-se menos e seria muito melhor para todos!

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010