sábado, 24 de julho de 2010

Aconteceu...cenas do prédio da minha infância

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A D. Maria era a lavadeira de Sintra, que de carroça e burro passava todas as semanas para buscar a roupa que entregava por passar na semana a seguir. Estamos nos anos 60, altura em que não tínhamos ainda máquina de lavar roupa. Ora a D. Maria era muito simples, tratava toda a gente da mesma forma. Fosse a senhora marquesa do 5º direito que para ela foi sempre a D. Amela, assim sem i, fosse a porteira a quem ela tratava de igual forma, a D. Emila, sem i também.

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Pois esta D. Emília, cá vai o nome certo, precisou algumas vezes de tirar dentes. O dentista seria raro e caro, mas ela não se atrapalhava. Atava ao dente um fio que prendia na porta de dentro do elevador, daqueles ainda com porta de lagarta em ferro. O senhor António, com quem era casada, subia ao 1º andar e puxava o elevador e lá conseguia, depois de algumas tentativas repetidas arrancar o dito.
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O marido, em expediente médico-cirúrgico não se ficava atrás. Tinha umas boas varizes nas pernas, e um dia pensou que se aquelas coisas ali estavam saídas, o melhor era cortar o mal pela raiz, como já tinha feito com uns calos e uns cravos. E assim o fez, na cozinha. Escolheu a melhor faca, afiou-a com todo o cuidado, sentou-se numa cadeira, esticou a perna e com toda a sua força tentou cortar aquela excrescência. Só que mal deu uma facada, o sangue jorrou com pressão saindo em jacto e sujando o tecto. Quanto a ele, caiu para o lado e foi levado de urgência em shock.
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Gente simples!

sexta-feira, 23 de julho de 2010

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Aconteceu...que há crianças que tiveram necessidade de crescer depressa!

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Entra, cumprimenta sem me conhecer, ar seguro. Tem uns 10 anos e senta-se à mesa onde a miúda holandesa está a tomar o pequeno almoço. Estou na mesa "dos crescidos", olha-me e diz: eu sei falar inglês, passei para o 5º ano e aprendi na escola. Queria meter conversa com ela, mas agora não me lembro, como se diz "qual é o teu nome"?

Digo-lhe, ela pergunta, a holandesa da mesma idade responde.

A conversa vai passar para mim. Conta-me que do 1º ao 4º ano teve na escola, nas actividades um professor de inglês. Mas está esquecida, como se diz "quantos anos tens?" Lá lhe digo. A conversa entre elas vai ser aos soluços, a portuguesa sempre a afirmar que sabe mas não se lembra.

Acaba por ir brincar com o amigo português que entretanto chega..

Mais tarde , na piscina, ela diz, "vamos a ver se posso vir logo outra vez" e o amigo português da mesma idade diz-lhe, foge, diz qualquer coisa ao teu pai e vem se ele não te deixar".

Venho a saber que o pai dela teve há anos um terrível desastre e está tetraplégico. Filha única é a auxiliar da mãe para muitas coisas, até tratar do pai..

Fez-se luz no meu espírito. Sabe falar inglês, embora só tenha aprendido umas frases na escola. Despachada. Teve necessidade certamente de ter ter crescido à pressão, perante a força das circunstâncias, a doença do pai. Fazer de crescida, ser autónoma.

Poderá ela, como o outro, mentir ao pai? Aquele pai frágil que ela sabe que com ele não se pode zangar porque ele não se pode defender?.

Há crianças que, por terem familiares de quem dependem, mas que de alguma maneira são fracos, deprimidos, psicóticos, deficientes, tiveram de dar saltos no crescimento, cuidar de si próprias, ficar com responsabilidades acrescidas, e ficaram hipermaturas (maduras na aparência). Por baixo, frequentemente ficam falhas, humores que riscam descompensar um dia, depressivamente, mas não sempre, felizmente.
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Há vidas que obrigam a isto, ser-se crescido quando se devia ser criança. São uns sobreviventes!

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Poema - valter hugo mãe

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duvido que volte a cair neve
enquanto eu estou a olhar.
tenho os olhos quentes e aqueço
tudo em redor. a espera põe-me
assim. se vier chuva sou só eu
a chorar

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Acontece...que com as novas experiências se cresce

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Custa-me sempre ouvir uma mãe ou um pai dizer que superprotegem os filhos. Normalmente isto é dito com sinal positivo, mas eu faço a leitura contrária.
Muitas vezes são crianças limitadas na exploração do mundo, de experiências.
Com rotinas pouco ou nada criativas.
Os pais devem de alguma maneira "tomar conta" do mundo que é explorado, saber onde, quando, com quem, e depois ajudar a criar o prazer da novidade, dando alguma liberdade controlada.
As crianças só enriquecem com isso.
Lembro-me de pais que não deixam as filhas ir a casa de colegas "porque podem ser abusadas sexualmente". Ora nós sabemos que a maior parte dos abusos é intra familiar, ou de pessoas muito próximas, professores, amigos dos pais. São medos que são limitativos do desenvolvimento social.
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Estou na minha primeira etapa das minhas férias.
Numa quinta no centro do país, estou a fazer, pela "enésima" vez, um curso de joalharia. Já aqui disse que tem trabalha intelectualmente e sobretudo com as dificuldades psicológicas ou mesmo com a doença mental, tem de ter escapes diversificados. Este é um dos meus.

Mas esta minha conversa de hoje sobre novas experiências, tem a ver com o facto de neste curso, onde somos 8 (numero máximo aceite), ser composto por um austríaco, uma finlandesa, uma francesa, uma holandesa e os restantes são portugueses. Ao almoço falou-se português e inglês, sobretudo, porque curiosamente os estrangeiros querem aprender português. Falamos das nossas profissões, da nossas terras. Tirando os professores, nenhum de nós transformou até hoje este hobby em profissão.
Enquanto grupo, estamos a conhecermo-nos.
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Na mesa redonda ao lado, um grupo também diversificado de crianças com as nacionalidades dos adultos mais uns suiços cujos pais vieram deixar-los uma semana para que tenham outras experiências. Idades entre os 5 e os 9 anos. Com eles estão animadores sociais e os donos da quinta que são de uma qualidade afectiva e artística rara.
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Crianças e adultos que se conhecem, novos hábitos, novas comidas, novos relacionamentos, para alguns a primeira experiência de dormir fora de casa.
Estamos já disse, numa quinta, onde há uma imensidade de coisas com as quais as crianças da cidade não convivem habitualmente, e que vão conhecer/viver/compreender. Brincar com poucos brinquedos, sem electrónica, mas com muita criatividade.
Nos intervalos, há sempre a hipótese de um mergulho na piscina, que, com o calor que está, sabe muito bem.
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Estes miúdos e os graúdos nos quais me enquadro, vamos todos sair mais ricos.
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Coitadas das crianças que só podem experimentar o que já é conhecido! Que grande desprotecção!

domingo, 18 de julho de 2010

Poema - Nuno Rocha Morais

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Invadiu-me uma sensação de calma,
de tristeza e de fim.
Virginia Wolf
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Ao teu lado, mudo.
Suponho que pousei a mão
No teu ombro, não sei,
Ausentes ambos.
Tu do ombro, eu da mão.
Lá fora, não muito longe
Do vidro, a manhã passa
E é calma, tristeza, fim.