sábado, 13 de março de 2010

Aconteceu...ainda a propósito da escola


Estas semanas foram "ricas" em acontecimentos que puseram a escola nas primeiras notícias, com o alegado suicídio de um aluno de 12 anos e o suicídio de um professor na casa dos 50 anos.

Muitas coisas se dizem, muitas se escrevem, muitas se silenciam.
Nos casos de suicídio, a propaganda do facto não é bem vinda e pode ser muito contraproducente. É conhecido o fenómeno do "contágio".

No entanto o silêncio do Conselho Executivo da escola de Mirandela parece demasiado. Um breve comunicado teria sido bem vindo. O contacto com a família teria sido obrigatório, seria o mínimo da solidariedade e empatia com ela.
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É grave o que se anda a dizer e a escrever, que o professor da escola de Fitares se suicidou por causa dos alunos. A causalidade linear há muito foi posta em causa. Há a considerar sempre características pessoais internas e factores externos. As dificuldades em gerir no momento a sua profissão, poderá ter sido um factor precipitante, uma vez que seria do conhecimento da escola as dificuldades que o professor teria com os seus alunos. Li que ele fez várias participações a quem de direito na escola e que nada foi feito. Veremos isto como uma ausência de solidariedade de classe?
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Quando alguém está em sofrimento, não será mandatório estudar o assunto e tomar medidas rapidamente? Fazer com que a pessoa sinta que já não está só?
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O suicídio resulta do sentimento de impossibilidade de descobrir uma saída. No entanto há sempre alguma. E quando não a descortinamos a sós, precisamos de a procurar em conjunto com alguém. Frequentemente o suicidário está deprimido, o que faz com que pense tudo de forma negativa.
Só a morte não tem retorno. Por isso tem de ser evitada com uma intervenção solidária, activa a vários níveis, que parece que não terá existido de forma suficiente em nenhum dos casos.
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sexta-feira, 12 de março de 2010

Poema - Mário Cezariny

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JORNAL

Da janela à rua. Feliz dia.
À serra da Estrela, um nevão.
Vinte defuntos na Turquia.

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Memórias do grande homem no verão.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Aconteceu...a propósito de escola

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Conforme se pode ver pelo emblema que tenho neste blog, fui aluna do Lycée Français Charles Lepièrre em Lisboa. Andei lá da infantil até ao último ano do liceu. Dali passei para a faculdade.
Era um ambiente diferente dos liceus daquele tempo, escola mista, bilingue, com um naipe de professores especiais, antifascistas, alguns até proíbidos de trabalhar nos serviços públicos e que, mesmo a propósito da matéria obrigatória nos ajudavam a problematizar e pensar. Os alunos, com raras excepções, eram filhos da burguesia que tinha dinheiro para pôr lá os seus filhos e com acesso a meio cultural privilegiado.
No meu 1º ano da faculdade, assisti a uma enorme discussão entre colegas, por motivo que já não me recordo. Mas lembro-me que ao chegar a casa, contei o episódio ao meu pai, rematando com ar crítico que a colega parecia uma peixeira. Com o ar sério que lhe conhecia, ele chamou-me a atenção que talvez ela fosse de facto filha de uma peixeira, eu já não estava no meu liceu e agora poderia ter filhos de gente mais popular. E que eu devia ter sempre isso em atenção e respeitar todos. Foi uma conversa que me marcou, talvez por estar farta de o saber pela educação que tinha recebido, mas que na hora, não tinha sabido aplicar.
Os meus filhos, tirando a infantil e a pré primária andaram sempre em escolas oficiais. Foi uma opção muito pensada, já lá vão uns anos. Correu bem, tiveram regra geral bons professores, quase todos do quadro da escola, turmas razoaveis. Tiveram alguns "encontros imediatos" que me parece foram capazes de resolver com "souplesse" e que não deixaram marcas, mas tão somente histórias para contar e rir.
Constato que muito mudou neste tipo de escolas, frequência massificada, onde por necessidade (?) o nivelamento do ensino está a fazer-se por baixo.
São as instalações, o staff dos professores nem sempre com o mesmo nível, os auxiliares, as condições de segurança, os apoios em falta, a instabilidade das carreiras, tantas falhas que tornam o ensino mais fraco e a escola mais insegura.
Preocupa-me que o nível de desenvolvimento cultural e emocional dos colegas nem sempre seja factor de estimulação.
Já faltou mais para que os meus netos entrem para a primária. Não posso ter intervenção na escolha que os pais farão da escola, mas lá que, silenciosamente penso e me inquieto, ai isso é verdade.
Há muito trabalho a fazer neste campo para que possamos, com tranquilidade, perspectivar o futuro escolar das nossas crianças.

terça-feira, 9 de março de 2010

Poema - Mário Rui de Oliveira e escultura de Giacometti


Numa das esculturas de Giacometti, tocadas ainda de fogo,
um homem caminha, em movimento solitário e eterno.
Não sabemos se entra, se sai da morte, mas conseguimos reconhecer,
na nobreza do cobre, a própria condição humana.
Como benção ou danação, o escultor devolve-nos a vida em estado puro.
Viver é também isso. Percorrer um campo de anémonas,
quase com vergonha do que trazemos escondido, na mão.

segunda-feira, 8 de março de 2010

aconteceu ... a propósito de uma notícia - 4

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Há pessoas que passam por nós e nunca mais nos lembramos delas. Pelo contrário, outras que conhecemos por breve horas deixam uma marca na memória.
Li hoje que morreu num desastre de avionete o Costa Martins, capitão de Abril que tomou conta do aeroporto da Portela no dia 25 de Abril de 1974.
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A ocupação do aeroporto é uma história engraçada, uma vez que era suposto ele ter apoio de tropas que fariam o cerco mas que falharam na hora. No entanto, ele fingiu que estavam e cumpriu a missão que lhe tinha sido destinada.
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Conheci-o um dia em casa de amigos. Senti-me junto de um Arsène Lupin ou de um 007, personagens que a existirem, admiramos e receamos simultâneamente.
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Das muitas histórias que contou nessa tarde, relembro duas:
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1ª - Militar da força aérea, explicou que quando tinha de embarcar num avião nos treinos habituais, perguntava sempre qual o avião que lhe tinham preparado. Posto o que nunca ia no que lhe tinham destinado.
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2ª - Acusado de factos graves e consciente que eram mentira, pôs o estado em tribunal e pôs-se a estudar direito. Explicou-nos que quando tinha de estudar qualquer coisa era sempre o melhor e ficava a saber tanto ou mais que os outros. Daí que não quisesse um advogado, sentindo-me melhor defendido por ele próprio.
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Personagem inteligente, desconfiado, corajoso que terá vivido por vezes no limite/risco, a morte pregou-lhe uma partida na aeronave de um amigo.