sábado, 26 de junho de 2010

Poema - Luís Filipe Parrado

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NATUREZA MORTA COM MAÇÃS
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É triste
o espectáculo do amor
apodrecendo aos poucos
na fruteira
as maçãs que te trouxe
têm agora a pele seca e enrugada.

quinta-feira, 24 de junho de 2010

Aconteceu...que brincar é coisa muito séria.

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Fui à praia com o Vicente que tem 5 anos feitos recentemente. Maré baixa, ficamos na areia seca, bem longe da água que nestas marés não chegará certamente ali.
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Num afã enorme vai construíndo um buraco, que me explica ser uma represa para prender a água. À volta em círculo, envolvendo esse buraco vai construindo uma muralha. Eu estou sentada e vou ajudando a juntar a areia com uns empurrões que vou fazendo com os pés. Não contente com a segurança, diz-me que vai fazer um muro por fora. Tem torreões, que já alguma criança tinha construído com um balde e ali tinham ficado. No meio dos dois muros um espaço por onde a água poderá circular se vier.
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Lembro-me dos fossos dos castelos e pergunto-lhe se uns crocodilos ficarão bem ali no fosso como guardiões. Recusa a ideia, não aqui não vai haver crocodilos diz-me muito sério. A brincadeira-construção continua.
No filme do Shrek havia um dragão que prende a Fiona. Será que poderia haver ali um, talvez em cima de um torreão?
O Vicente pára, olha para mim e diz-me, Ó Avó Magda, nós não estamos a brincar, isto é a sério!
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Brincar e jogar são coisas muito diferentes. O jogo implica regras, nele pode-se perder ou ganhar. Mas antes de jogar, todas as crianças deviam ter tido oportunidade de brincar.
Brincar, que a história que contei ilustra bem, é uma construção saída da conjugação da realidade externa e da interna, sem ser uma nem outra. É uma actividade criativa completamente necessária ao desenvolvimento.
Que bom que certos adultos conseguem manter viva a criança que existe dentro de si!

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Poema - Fernando Luís Sampaio

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Hoje, como ontem, duvido de anteontem,
e nisto arrasto a minha vida
entre manhã e noite,
passado e futuro.
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Mesmo que fuja de ti, sei sem saber
que serei uma volátil substância
no rasto demente da fantasia.

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Portanto, ou se calhar, até ver,
nestas ondas sou verdade inteira,
breve herói,
voo intocável,
falso humano.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Aconteceu...granizada nos pomares e recordações do odor das maçãs de Moimenta da Beira

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Já aqui contei várias histórias do meu Serviço Médico à Periferia, em Moimenta da Beira.
O Centro de Saúde ocupava o rés do chão de uma moradia grande, antiga prisão desactivada. Como habitação, foi-nos distribuído o 1º andar, antiga casa do carcereiro. Da prisão restava dentro de nossa casa, um antigo quadro eléctrico com muitos botões, campainhas e luzes das celas, essas já transformadas.
Entravamos por uma porta, a que se seguia um corredor pequeno, e depois havia as escadas. Por baixo das escadas uma pequena divisão, aproveitamento do espaço, sem janelas.
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Poucos dias depois de ocuparmos a casa, várias pessoas nos vieram oferecer caixas de maçãs. Uns peros amarelos e umas maçãs vermelhas com o melhor cheiro que queiram imaginar.
Ensinaram-nos a forrar o chão daquele espaço que se transformou em arracadação de maçãs com cartões, e depois sem que elas se tocassem, dispô-las, lado a lado, no chão. E assim ficaram um ano, sem apodrecerem nem um bocadinho. E ainda vieram em caixotes para Lisboa para acabarem em compota.
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Mas, o que é inesquecível, é o maravilhoso cheiro a maçã que nos acompanhou durante esse ano pela casa toda, mal se transpunha a porta da rua.
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Esta semana durante 1 hora caiu uma granizada em 10 freguesias de Moimenta da Beira. As maçãs que se salvarem vão ser um bem precioso.

domingo, 20 de junho de 2010

Aconteceu...que José Saramago disse

Pensar, pensar
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"Acho que na sociedade actual nos falta filosofia. Filosofia como espaço, lugar, método de refexão, que pode não ter um objectivo determinado, como a ciência, que avança para satisfazer objectivos. Falta-nos reflexão, pensar, precisamos do trabalho de pensar, e parece-me que, sem ideias, nao vamos a parte nenhuma."
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Revista do Expresso, Portugal (entrevista), 11 de Outubro de 2008, in Outros Cadernos de Saramago