terça-feira, 21 de setembro de 2010

Poema - Alberto Pimenta

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SUGESTÃO

já tentaste praticar o bem
fazendo mal?

já tentaste praticar o mal
fazendo bem?

já tentaste praticar o bem
fazendo bem?

já tentaste praticar o mal
fazendo mal?

já tentaste praticar o bem
não fazendo nada?

já tentaste praticar o mal
fazendo tudo?

já tentaste praticar tudo
não fazendo nada?

e o contrário, já tentaste?
já?

seja qual for a tua resposta,
não sei que te diga
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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Aconteceu...numa esplanada

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Fiz com a minha mãe, desde que me lembro, um exercício criativo que nos divertia imenso. Sentadas numa esplanada ou noutro lugar público, elegiamos uma das pessoas que nos rodeava e inventávamos-lhe a "sua" história. Tirávamos-lhe a "fotografia" e imaginávamos como ela seria, como teria sido, qual a profissão, a vida familiar, e até o feitio. Às vezes um futuro. Este jogo dava-nos um enorme prazer e uma grande cumplicidade. Nesta invenção, muito de projectivo era lá posto.
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Chamei-lhe jogo criativo. De facto já aconteceu encontrar pessoas que ficam completamente bloqueadas com ele, incapazes de criar uma personagem a partir da observação de alguém a quem se tiram algumas características.
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Também já encontrei quem ficasse escandalizado com ele, achando ser um acto de cusquice, o que não é de todo, porque se trata de fantasia.
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Mas também o acto de cusquice é em algumas situações divertidíssimo. E é cada vez mais fácil de o fazer, eu diria mesmo impossível de não o fazer. Todos os dias encontramos gente que fala alto de intimidades ao telemóvel. Ficamos a saber os problemas da família, os enganos dos vizinhos, as trapalhadas com os amigos, as gracinhas dos filhos, etc.
Há uma enorme falta de pudor com o telefone ambulante.
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Escrevo este pequeno texto numa esplanada a céu fechado num centro comercial, enquanto espero umas fotocópias.
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Não os vejo porque estão atrás de mim, mas sei que são três homens, na casa dos cinquenta/sessenta anos, que se encontraram bastante tempo depois de uma época de fadistia que viveram em comum. Estão eufóricos e dos seus telemóveis ligam para outros do mesmo grupo com quem tiveram grandes farras, passam o telefone de mão em mão e combinam encontros. Vou sabendo, por ouvir, as histórias das suas farras.
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Cusca? De todo!

domingo, 19 de setembro de 2010

Aconteceu...foto - Fim-de-tarde

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.......................................Foto - Magda

sábado, 18 de setembro de 2010

Poema - A. M. Pires Cabral

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Quando um dia - é fatal -
pousar sobre os meus ombros
aquele assíduo, rigoroso abutre
que voa sem rumor em círculos cautos
como a tirar as medidas do meu corpo -
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saibam todos que para esse tempo
tenho ainda alguns gestos de recurso
(que não revelo), com que espero
morrer mais comodamente.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Aconteceu...que às vezes sentimos que fazemos pouco

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Está na ordem do dia, proteger crianças de serem abusadas, batidas, negligenciadas pela família. Organizações, muitas delas estatais ou com apoio estatal, recolhem e têm por missão ajudar a crescer com dignidade quem a não tinha na sua família de origem.
Também mães e filhos são recolhidos e escondidos para se verem livres de maus tratos, enquanto se tenta que reorganizem a sua vida e possam encarar o futuro de outra forma.
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Mas frequentemente vemos instituições superlotadas, onde crianças e jovens convivem quase colados com outros e já com marcas maiores; os cuidados que prestados são só no sentido básico, alimentação, cama e roupa, sem atender às necessidades emocionais de cada um.
Instituições onde, por terem seres mais frágeis, são abusados, quer sexualmente como temos visto, mas também na sua dignidade.
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Um miudito africano queixava-se que o monitor lhe chamava sempre ó preto! Está bem, ele é preto, mas porque não chamava aos outros ó branco?
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Uma mãe com uma filha, acolhidas em casa abrigo para proteção devido aos maus tratos que recebiam do marido e pai, eram insultadas pelas auxiliares da casa. A miúda tinha na ausência da mãe castigos severos, sem explicação. Eram criticadas. Ameaçadas de serem postas na rua como retaliação. Será isto proteger?
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Outros queixam-se que os monitores "chamam nomes à minha mãe" como eles dizem, quando algum disparate ocorre.
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Temos uma sociedade com algumas organizações sociais e de solidariedade, é verdade, mas há que seleccionar e formar quem nelas trabalha. Os funcionários sem qualidade são uma minoria, mas é preciso fazer alguma coisa, a bem das pessoas em situação de fragilidade.
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E é bom lembrar, que as crianças de hoje serão adultos amanhã. Serão pais e serão mães. E que modelo terão dentro de si, se o modelo dos pais fôr repetido pelos que os acolhem?

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Aconteceu...Pôr-do-sol na marina

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............................Foto - Magda

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Poema - Ana Hatherly

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A PALAVRA ESCRITA
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A palavra-escrita
é um labor arcaico: sulca enigmas
venda e desvenda
o sentido do gesto
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é uma imagem detida
recolhida do mais fundo cinema íntimo
onde o verdadeiro
é um ser invisível
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O cinema do mundo está aí
onde houver ilusão
onde houver vontade de ver
mesmo que seja só o nada