quinta-feira, 21 de abril de 2011

Aconteceu...Incontinência verbal!

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Há pessoas por quem temos estima e consideração. Não que as tenhamos conhecido pessoalmente, mas pelo que fizeram nalguma época  e pelo que simbolizam.
Poderíamos dizer que se tornaram uns ídolos.
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Anos depois, começam  a disparatar. 
Não, não estamos a ouvir isto, pensamos. Não pode ser! Está totó! Xexé! Completamente xoné!

As pessoas envelhecem.
Pensar que é por doença que não sabem o que dizem, que estão a perder o juízo,  ajuda a evitar a critica, embora se fique triste.
Tenta-se assim, dentro de nós, preservar a sua imagem. 

Tenho uma amiga que costuma pedir que se algum dia a virmos fazer certas figuras, que a protejamos. Que alguém faça o mesmo comigo, se for caso disso.
E todos devíamos ter um ou mais amigos para essas alturas. Evitar-se-ia muita coisa. Não pensem que estou a defender a interdição  ou coisa parecida. É que a troca de ideias pode bastar para fazer a pessoa cair em si, depois de pensar...e antes de falar ou fazer.

terça-feira, 19 de abril de 2011

Poema - Miguel-Manso

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estão a demolir pedra
a pedra o prédio do lado


quem passa agora na rua
parece lamber com o olhar
a falta de um dente

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Aconteceu..."Fome"

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(...) Sabe Deus, pensei, se alguma vez mais valeria a pena voltar a procurar emprego. Recusas, meias promessas, meros e secos "nãos", expectativas alimentadas e destruídas, novas tentativas, tudo acabara em nada e fizera com que eu tivesse perdido o ânimo. Por fim, requeri um lugar como cobrador de dívidas, mas cheguei demasiado tarde, além disso não teria podido arranjar cinquenta coroas, para depositar como fiança. Surgia sempre qualquer obstáculo. Também me candidatei à corporação de bombeiros. Estávamos cinquenta homens num átrio e enchíamos o peito para darmos a impressão de força física e valentia. Veio um funcionário fazer a inspecção a todos os candidatos: apalpou-lhes os braços e fez-lhes uma ou outra pergunta. Contudo, por mim limitou-se a passar, abanando a cabeça e disse que estava excluído por usar óculos. Voltei lá sem óculos, perfilei-me, franzi as sobrancelhas e dei aos olhos uma expressão acutilante, mas o homem voltou a passar por mim e sorriu. Tinha-me reconhecido. O pior de tudo era que a minha roupa começava a ficar num estado tão lastimável que eu já não podia apresentar-me onde quer que fosse como uma pessoa decente. (...)

Este trecho, escrito por Knut Hamsun e publicado pela 1ª vez em 1890, é actual e poderia ter sido escrito hoje. Hélas!

domingo, 17 de abril de 2011

Aconteceu...Arte urbana...no chão do cais

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.................................................Foto - Magda

sábado, 16 de abril de 2011

Poema - Sophia de Mello Breyner Andressen

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AS CASAS

Há sempre um deus fantástico nas casas
Em que vivo, e em volta dos meus passos
Eu sinto os grandes anjos cujas asas
Contêm todo o vento dos espaços.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Aconteceu...que não andava de taxi há muito tempo

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Então não havia de saber onde fica a sua rua, eu ando nisto há 46 anos, diz o taxista que eu tinha chamado para me levar ao aeroporto.
Quando a menina da central me disse para entrar pela parte antiga do bairro disse-lhe logo que isso era para os novatos, eu conheço Lisboa como as minhas mãos.

Sim, porque isto é uma vida muito má mas da forma que a coisa está má em todas as profissões ainda há quem venha para isto.

É uma vida de perigo, sabe, eu conto-lhe, às vezes só apetece não parar, mas quem vê caras também não vê corações.

Olhe, um dia à noite, uns 3 mal encarados mandaram-me seguir ali para São Brás, eles tinham mesmo mau aspecto, mas que fazer, queriam que eu fosse para uma rua de barracas, mas eu desconfiei e não fui. Com prédios sempre me sinto mais seguro, eles ficaram furiosos e mandaram-me parar. Saíram, e o que ia atrás de mim veio aqui à minha janela e disse "ó velhote segue lá que nós gastamos tudo e não temos dinheiro para te pagar", que havia eu de fazer, segui e fiquei com os quinze euros de calote.

Estou sempre muito atento mas às vezes, nunca se sabe.
Olhe, conto-lhe outra, esta já foi há muitos anos, mandaram-me parar, e queriam ir para a Caparica, um sentou-se aqui ao meu lado e outro lá atrás, fiquei logo de sobreaviso, mais ainda quando o da frente tirou uma caneta que eu tinha no tablier e meteu ao bolso.
Ainda havia portagens no lado de Lisboa e eu pedi-lhes uma nota de cem para pagar a portagem, que não, que pagasse eu, e eu paguei. Só que fui direito à GNR, saí de imediato do carro e contei ao guarda que aqueles pelintras nem dinheiro tinham para pagar a portagem. Os guardas foram porreirinhos, mandaram-nos sair e eles saíram. Mas um deixou uma faca grande ali no banco de trás, depois de apalpados o outro também tinha uma,  olhe ficaram logo os dois no posto.

Isto é uma vida de perigo, minha senhora, chegamos e faça um boa viagem.

De perigo e de solidão, pensei eu, que quase não abri a boca durante toda a "corrida". Ele tinha mesmo necessidade de falar...e eu ouvi.