72º dia de isolamento social (COVID-19)
Desconfinada mas isolada
Um destes dias falava com um amigo por mensagem. Quando lhe contei que faço uns quilómetros a andar na praia, perguntou-me se eu era uma pessoa solitária.
Fiquei a pensar na pergunta. Solitário, pode ler-se no Dicionário Primberan "Que vive no ermo, que foge da convivência, que vive longe, abandonado por todos=só". Não, não me reconheço.
Nas minhas passeatas estou comigo, por isso acompanhada.
O meu pensamento voa, livre, já houve assuntos que tratei comigo. Penso imenso e isso descontrai-me.
Outras alturas fico contemplativa. Olho o que me rodeia, são as cores, as ondas, as conchas e até o movimento da água quando chega junto de mim. Há outras coisas que vejo e algumas trago para casa, sempre a pensar em que as posso transformar. Dar outro sentido diferente daquele que qualquer coisa teve dá uma enorme satisfação.
Ontem trouxe um bocado de cano de ferro amolgado e com muito tempo de água. Hoje um bocado de ferro dobrado em quadrado e com umas peças nas bordas. De alguma armação de pesca?
Mas às vezes olho as pessoas. Faço muitos metros sem ver nenhuma mas ontem vi as costas de um homem com algumas tatuagens como se vê por aí. Mas esta era diferente. Como se a cintura onde acabam os calções fosse o chão. Para cima mais de uma mão-travessa de desenhos, horríveis, incómodos. O que terá acontecido àquele homem para tatuar um cemitério, cheio de campas e cruzes? E lá fui eu, pensamento a girar, a imaginar a vida de um homem que não conheço, que nem a cara vi mas cuja tatuagem me impressionou.
Pensando bem, solitária por vezes mas não sozinha.