50º dia de isolamento social (COVID-19)
Quinquagésimo dia!
Dei-me conta do tempo, esse grande escultor, diria a Marguerite Yoursenar, onde ela relaciona o passado com o presente. Aqui o tempo não tem espessura, é o tempo subjectivo que devia contar e esse é muito pouco rico. 50 dias sem estar ao vivo com a família, os amigos, andar pelos locais que gosto, ir ao cinema, tanta coisa. E nada ficará como antes.
A florista do bairro esteve de manhã no local habitual com os seus cestos de flores. Soube isso quando me bateram à porta, dois toques como sempre faz o meu filho Martim. E sem entrar, esticou o braço e deu-me um ramo de gérberas, vermelhas e amarelas alaranjadas embrulhadas em ramos verdes. O dia da Mãe é amanhã mas as flores chegam hoje, disse. Nem um abraço nem um beijo pudemos dar nem mesmo um tempo de conversa. Sempre de braços esticados para medir a distância.
Hoje de tarde, depois de ter conversado ao telefone com um amigo que mora noutra cidade e me contou que foi até ao pé do rio, se tinha sentado numa pedra e ali ficara, tentando divagar. Quando se levantou percebeu que tinha menos peso. Só nessa altura se deu conta da tensão que trazia dentro dele e que por lá terá ficado.
Também eu precisei de arejar. Uma desculpa, uma justificação, as baratas, vou comprar o "remédio", amanhã mato-as todas. Pensamento pobre em tempo de confinamento obrigatório.
Ontem disse à Isabel, minha empregada, que ainda não a quero cá. Cansada de estar em casa, também ela com saudades, disse-me que a patroa da amiga a tinha ido buscar e levar de carro para não andar nos transportes públicos. Sim, é uma ideia. Daqui a uns dias penso no assunto. Para já vai-me fazer na casa dela croquetes, rissóis e pasteis de massa tenra.