terça-feira, 5 de outubro de 2010

Aconteceu...muitas rotundas para os carros e uma escola quase sem recreio para as crianças

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Dizia-me ontem um habitante da cidade de Viseu, com orgulho franco e sorriso rasgado, que a cidade já tinha 170 rotundas. Percebi que o progresso se mede em redondéis, prédios altos, centros comerciais e outros que tais.
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No mesmo distrito, em Tarouca, levaram-me a visitar por fora a nova escola primária, edifício de boa construção e grande. Gradeamento à volta, mas... onde é que está o recreio? Lá me mostraram um bocadinho de terreno que ficava ali até ao portão. E que, como as crianças não cabem lá, o recreio é faseado.
Mesmo assim não dá para correr ou jogar à bola.
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Diariamente ouvimos as senhoras professoras, a queixarem-se das crianças turbulentas, hiperactivas. Muitas vezes encaminham as crianças para o médico especialista na esperança que saia de lá com um remédio que o torne mais quieto.
Depois de ver aquele espaço minúsculo, fiquei com vontade de sugerir a construção de uma rotunda sem carros mesmo ao pé da escola. E sem escultura, só aplanada, com uns apetrechos de brincar, umas balizas, uns cestos de basquetebol, marcas no chão para se jogar à macaca ou ao avião, e espaço, espaço para que as crianças possam brincar, correr e gastar de forma satisfatória as suas energias nos intervalos escolares!
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Virá daí mal ao mundo se transferirem uma das rotundas de Viseu, e a cidade ficar só com 169?

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Aconteceu...exposição de Tapiès

Uma exposição da obra gráfica de Tapiès está no Museu do Douro, na Régua. Cheia de simbolismo, valeu a pena ir ver.
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....................................................Foto - Magda

domingo, 3 de outubro de 2010

Poema - Fernando Assis Pacheco

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Por cada mil pobres só um rico
aqui está um assunto a ponderar
atenção ao comércio de víveres
servido pela rede ferroviária
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não vejo virtude na miséria
Deus pode ter-se equivocado
se precisarem de exterminar alguém
não esqueçam os tropas e os advogados

sábado, 2 de outubro de 2010

Aconteceu...capacidade empática

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Os pais da Ana e do Pedro andaram muito tempo desavindos. Poucas conversas entre eles, entremeadas com discussões e gritos, que depois tentavam abafar ao lembrarem-se dos filhos.
Os irmãos, de menos de 8 anos, abrigavam-se no quarto, assustados, e tentavam apoiar-se mutuamente.
Esta relação entre os irmãos era uma forma de sobrevivência
Duraram algum tempo estas zangas e guerras entre os pais, até que resolveram separar-se. Virados para si próprios pouco falaram com os filhos sobre o assunto, e os miúdos foram para casa dos avós, numas férias prolongadas.
Os pais foram tentar a vida, separadamente para longe. Muito de vez em quando apareciam.
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Dois anos se passaram. Um dia a mãe veio avisar que tinha arranjado namorado e casa e levou a Ana com ela. Foi muito difícil a despedida dos irmãos.
Quinzenalmente ela vinha passar o fim de semana com o irmão e os avós.
Nessa altura brincavam muito. Falavam pouco da sua situação de se encontrarem separados. Para o Pedro, a mãe tinha preferido a Ana. Ela também pensava o mesmo e sentia-se mal com isso.
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Certo dia, estando a brincar no jardim, ouviram um miar aflitivo. Foram procurar e era um gatinho pequeno, muito bonito, amarelo às risquinhas. Estava sozinho. Os irmãos aproximaram-se e ele não fugiu. Deixou-se acarinhar, calou-se por breves instantes.
A Ana, toda entusiasmada, propôs logo ao irmão levá-lo para casa. Vem connosco, disse ela, os avós vão deixar de certeza, tratamos dele e ficaremos com um gato para brincar.
O Pedro hesitou. Então, dizia a Ana, qual é a tua, não gostas da ideia?
Depois de mais um bocado em silêncio, o Pedro sugeriu naquela voz baixa e doce que por vezes tem, vamos buscar leite e uma manta. Quem sabe se a mãe volta para o buscar? A Ana aceitou.
Quando no dia seguinte voltaram ao jardim, o gatinho já não estava lá. O Pedro ficou contente e sorriu de forma discreta e enigmática.
A mãe gata tinha voltado para buscar o seu filho. Talvez um dia...

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Poema - Pedro Tamen

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Quando, ao cair da noite,
zumbe lá fora algo que não conheço,
será talvez o roçagar das nuvens
ou o ar agitado por um aceno
que me chama para longe deste banco.
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E de repente choro
tentando não molhar a paz evanescente
que as minhas mãos seguram incompleta
e que um dia, perfeita, falará
ela própria comigo, meu destino.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Aconteceu...há quem respigue para comer...sem IVA por enquanto!

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Oiço sempre que posso, as crónicas do Fernando Alves na TSF. Muitas vezes falar de coisas que desconheço, outras, como hoje, falou de qualquer coisa que estou farta de saber, a fome em Portugal e a inúmeras pessoas que andam à procura de comida nos caixotes do lixo. Sentimo-nos muito incomodados, são situações que nos envergonham.
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Há alguns anos dei um passeio pela Serra de Santo António. Terras pobres, cheias de pedras e de grutas, a população teve de se virar para a indústria das lãs, mantas, camisolas, o que safou muita gente. Pouca agricultura, só algumas vacas e cabras, as salta-catrepa como se diz em "calão" míndrico.
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As pedras fazem muros, umas em cima das outras, para separar propriedades. Ou cobrem extensões de terreno, com formas diversas, modeladas, os lapiás. Algumas fazem autênticas bacias, as pias, umas maiores outras mais pequenas, onde as águas da chuva se guardam e servem para os animais matarem a sede.
Outras, mais estreitas e com alguma profundidade, serviam para guardar o bagaço da azeitona (o que resta depois de espremida a azeitona para a feitura do azeite), e que, misturado com sal para conservar, ia servindo de alimento ao porco.
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Ao ir espreitar um desses buracos, uma velhota toda curvada, aproximou-se com curiosidade. E foi ela que nos explicou o que era a cova do bagaço. E solicita, ofereceu-se para nos ir mostrar umas enormes pias que ficavam num terreno particular mas onde ela podia nos levar.
Custou-nos aceitar porque ela era tão velhinha, que imaginamos o esforço que ia fazer, pelo caminho fora a pé. Insistiu, e lá fomos.
A certa altura, baixa-se ainda mais (dobrada já ela estava) e apanhou do chão qualquer coisa que meteu no bolso. Fiquei curiosa e mostrou-me, era uma fava, um bago de fava. E disse-me que teria caído quando transportaram outras que por ali teriam sido debulhadas, e que era tão boa como as outras. Havia de a comer.
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Da televisão que só oiço, sai a voz dos nossos dirigentes a apresentar as medidas económicas "para compensar o deficit".
Respigaria algum deles uma fava do chão? Não me parece, mas receio que a taxassem!