NATAL
Nasceu.
Foi numa cama de  folhelho
entre lençóis de  estopa suja
num pardieiro  velho.
Trinta horas  depois a mãe pegou na enxada
e foi roçar nas  bordas dos caminhos
manadas de  ervas
para a ovelha  triste.
E a criança  ficou no pardieiro
só com o fumo  negro das paredes
e o crepitar do  fogo,
enroscada num  cesto vindimeiro,
que não havia  berço
naquela  casa.
E ninguém conta  a história do menino
que não  teve
nem magos a  adorá-lo,
nem vacas a  aquecê-lo,
mas que há-de  ter
muitos Reis da  Judeia a persegui-lo;
que não terá  coroas de espinhos
mas coroa de  baionetas
postas até ao  fundo
do seu  corpo.
Ninguém há-de  contar a história do menino.
Ninguém lhe vai  chamar o Salvador do Mundo.
 
