terça-feira, 1 de novembro de 2016

O luto...pelo cão



Já tinha sabido há uns dias, morreu o cão dos meus vizinhos.
Todos os dias à noite via o casal, já perto da 4ª idade, e o seu cão, até altas horas, sentados num parapeito em frente ao prédio. Nunca vi o cão no chão, estava sempre ao colo da dona. Ao lado, uns sacos, comida e água para ele beber. No bolso da senhora sempre uma doçura para os cães que lá queriam meter o focinho e que ficavam sempre a ganhar.
Tinham-me contado que agora sem cão, continuava a passear a trela.
Hoje à noite, ao entrar para a garagem lá estava ela. Sòzinha, com a trela na mão. Por impulso parei o carro na rampa e saí. Dei-lhe um abraço e beijei-a, disse-lhe umas palavras de conforto, como quem conforta quem perdeu um ente querido. Sim, habitualmente uma pessoa.
Ela chorou, disse-me que está a ser muito difícil, que o marido não tinha vindo porque ela tinha-lhe pedido, parece que se sentia mais perto do cão se passeasse sòzinha.
Um idiota qualquer, saiu com o carro da garagem sem respeito por aquele momento e tive de a deixar, ali, só, com a trela vazia.
E subi o elevador com a tristeza colada a mim.

segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Quando a boca da Mãe abre sem pensar no que diz



Ontem, uma mãe a falar para o filho de 9 ou 10 anos:

Ah, meu grande filho da puta, vem cá já para a minha beira.
Tu devias era magoares-te muito gravemente para veres como é.


terça-feira, 6 de setembro de 2016

É Setembro e a noite está quente


3 da manhã. Acordo. Não estou bem, não sei precisar o que sinto mas ainda nem tentei perceber.
Aborrece acordar assim, cedo na noite, inquieta-me pensar quanto tempo ficarei acordada. 
Na mesa pequena a meu lado tenho uma banana, como-a, a casca cheia de pintas castanhas como gosto, está madura e doce,  sabe bem sentir o estômago aconchegado, mesmo que não seja o mais indicado em termos de saúde, preparo-me para ler e ligo o rádio.
Do outro lado ouço: Lisboa a esta hora com 27ºC.
Não preciso de mais nada para entender porque acordei. Ligo a ventoinha e leio umas páginas e pouco depois estou a dormir.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

Não, não era o termostato avariado...


Ai que frio, tanto vento! diz a mulher que espera o sinal verde na mesma passadeira que eu.
Já passava das 14 horas, o ar era bastante quente e a aragem também.
Continuei o meu caminho mas a pensar na solidão de algumas pessoas que dizem qualquer coisa só para não se sentirem tão sós. 

quinta-feira, 28 de julho de 2016

E ainda, diagnóstico de uma mulher sujeita a violência doméstica


Numa consulta de um colega meu:
Sr. Dr. acho que o meu marido tem uma outra. O médico pergunta-lhe porque pensa isso ao que ela responde sem hesitar: porque deixou de me bater.

Tanto que há para fazer!

terça-feira, 26 de julho de 2016

Amor, quanto mais me bates mais eu gosto de ti?


Leio com frequencia relatórios sobre crianças, jovens e suas famílias.
Hoje li mais um. Jovem com problemas de comportamento.
Familia que sempre viveu na miséria, desemprego, subsídios eles também miseráveis, o pai com alcoolismo crónico, discussões frequentes assim como violência física exercida pelo pai à mãe, desorganização e falta de capacidades para orientar o filho desde tenra data. Tudo ingredientes para dificultar o crescimento harmonioso!
Eis que finalmente, mais de uma década de vida em comum, os pais separam-se.
Finalmente! digo eu, porque no relatório o que estava escrito é "ponto final no relacionamento amoroso"! Tanto amor!




segunda-feira, 18 de julho de 2016

A viagem de comboio e a criança que gostaria de passear lá dentro


Vou no comboio. Um pouco à frente uma criança dormia. Só lhe via a cabecinha. Quando acordou o pai passou-a para a mãe que lhe deu a mama.
Agora vejo bem a criança. É um rapazinho vestido à rapaz, jeans compridos e camisa embora talvez não tenha ainda 2 anos.
Acabada a mamada (quantos dentes terá?), inicia um período de queixume, choro, ao colo da mãe pontapeia o banco da frente com as suas "crocs", vigorosamente. Da mãe passa para o pai, do pai para a mãe e até para a avó. A família ocupa três bancos duplos, uns em frente dos outros. 
De repente faz-se silêncio. Olho e ele está sorridente de pé. Vejo que até anda sozinho, mas a mãe tem-no seguro pelo pulso como se de uma coleira de braço se tratasse. Quando tenta andar e não consegue recomeça o choro, protesto com sons e gritos.
A mãe põe-no ao colo e segura o telemóvel para ele ver um filme de desenho animado. Ele cala-se um bom bocado. Depois recomeça querendo ir para o chão.
Sempre gostei das viagens de comboio precisamente por me poder levantar e dar um passeio, da carruagem ao bar ou da minha a outra carruagem.
Tenho a certeza que o puto teria adorado passear, apeteceu-me lembrar isso à mãe mas por pudor não o fiz.