domingo, 29 de setembro de 2013

Aconteceu...o voto, uma conquista de Abril. "Pormenor" esquecido?

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Eleições autárquicas, hoje.

Depois de votar no edifício bonito da Junta da minha freguesia, passei pelo Largo do Coreto e comprei um cravo vermelho à Maria do Céu, a florista de rua cá do bairro. É que a possibilidade de votar é uma conquista do 25 de Abril! Há quem se esqueça disso. Gostariam de ter quem pensasse por eles sem direito a expressar a opinião como umas décadas atrás?
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Há gente muito esquecida, mas também mal esclarecida. Todos os que se recusaram a votar com destruição de urnas, roubo de boletins de voto, devido às alterações nas freguesias, esquecem-se que houve entre os partidos quem não concordasse e votasse contra. Não fazia mais sentido votar nesses e dar uma coça aos que estiveram a favor? Desconfio que sei porquê...

sábado, 31 de agosto de 2013

Aconteceu...Ai os médicos é que são os cabrões?? Também os há mas não generalizemos.

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Descia eu ontem a Avenida da Liberdade a pé, quando vejo um homem que vem em sentido contrário aos gritos "Quem me ajuda, quem me dá alguma coisa para comer!".
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Era um homem com ar de velho, talvez envelhecido precocemente, pernas arqueadas, grande papada de bócio e vinha apoiado numa bengala tipo cajado. 
Ao passar por mim pára e pede ajuda para comer. Prontifiquei-me a puxar do porta-moedas e ele vai falando. Ainda não comi, explica-me, venho agora de uma consulta no hospital. Grandes cabrões, acrescenta.
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Eu ainda não tinha tirado o dinheiro para fora e pergunto-lhe, cabrões? quem ? Resposta rápida, os médicos... só sabem passar receitas. Não resisti e disse-lhe, ó senhor, olhe que eu sou médica.
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Pronto, pensarão, lá usei um truque baixo, o poder médico, a autoridade habitual da minha corporação. 
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Ele ficou muito atrapalhado e disse-me "Ah, mas a sra não é com certeza!".
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Mas eu resolvi continuar a conversa, concordei com ele que havia por aí muitos cabrões, o sr anda aqui a pedir na rua, o que, se as coisas estivessem diferentes podia não estar, ter a ajuda do estado.
E perguntei-lhe onde ele achava que havia cabrões neste país. Ficou a olhar para mim, não sei, disse. Expliquei-lhe onde estavam, no governo que o deixa desamparado, nas políticas sociais e de saúde que desprotegem as pessoas e acabei por lhe dizer, no governo. Olhou para mim como quem não me entendeu. 
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Dei-lhe a moeda e segui, sem saber se havia de me entristecer ou de rir com esta cena.

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Acontece que há um risco de epidemia de incendiários

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Apaguei a televisão há pouco. Nos telejornais, em todos, grandes notícias sobre os incêndios, focados daqui, daqui e de acolá. Por cima e por baixo. Saltam de um para outro, entrevistas, gritos e choros. E as chamas, enormes labaredas de uma cor espantosa, brilham no dia ou na noite. É um espectáculo de horror.
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Vai-se ao facebook e são inúmeras as pessoas que publicam os seus próprios vídeos, sempre de forma a focar o ângulo mais impressionante. Põe um, põe um segundo aprimorado e um terceiro, upgrade com mais imagens. 
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Tem havido muitas desgraças e muitos heróis.
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Será que já pensaram o que estas imagens passadas vezes sem conta podem provocar? Sim, quantas pessoas não ficam excitadas com o fogo? Quantas não gostam de admirar o trabalho dos bombeiros? E o risco de aumentar o número de incendiários, pelo prazer da emoção? 
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Na minha opinião, estas situações deviam ser transmitidas cirugicamente, só mesmo o necessário.
Haja tento, cadeias televisivas, não deitem mais achas para a fogueira! Isto pode ser epidémico!

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Os canalizadores serão todos gordos?

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Devia ser uma obrigação da escola ensinar umas coisas importantes para a vida.
Voto numa cadeira obrigatória de canalização desde o 5º ano até ao 9º, podendo-se continuar se o aluno assim desejasse.
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Há alguns anos em Lisboa indicaram-me um. O sifão do lava-loiça ou coisa parecida deixava pingar água. É com o credo na boca que ao telefone pedimos os serviços. E se ele não puder? 
Veio. À porta apareceu um grande obeso e um problema respiratório que se detectava facilmente pela inspiração e expiração ruidosas. Deitado no chão, de cabeça mal metida no armário, ele lá tentou desmontar os canos. Foi um processo demorado porque os braços gordos não se movimentavam no espaço exíguo. Horas mais tarde lá conseguiu e eu respirei fundo. Receei que durante aquele espaço de tempo o homem se apagasse ali em casa.
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Há dias encontrei os armários que ficam por baixo do lava loiça cheios de água, as loiças todas molhadas e sujas. Pedi que me indicassem alguém e esperei ansiosamente, com uma tijela a aparar as gotas que se viam cair dos canos. Apareceu hoje. Não direi que deparei com um grande obeso, mas um homem gordo com uma enorme barriga, que transformavam a figura do Ché na camisola reconhecível sobretudo pela boina e pela estrela.
Bom, não arfava, mas o resto foi quase igual à experiência que já tinha tido. Este dizia que os tubos eram tão finos que os dedos não entravam (pudera!) e não conseguia chegar aos parafusos. Foram algumas horas de manhã e outras da parte da tarde. 

Depois de várias peripécias, como de peças novas avariadas e a terem de ser trocadas na drogaria do Largo 1º de Maio onde tinham sido compradas, perante o protesto da senhora do balcão, a coisa ficou resolvida.
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Perante estas experiências pergunto-me se os canalizadores serão todos gordos? 

quinta-feira, 25 de julho de 2013

5ª feira da avó Magda, bem diferente das habituais

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Conheço muitas avós que, coitadas, por razões várias mas raramente boas, são as mães dos netos. Numa idade em que já se criaram os filhos, que já se trabalhou muito, ficam com a difícil missão de estar com as crianças a tempo inteiro.
Outras, ficam com eles todos os dias até que chegue a idade de entrarem para o jardim infantil ou a pré e quantas vezes continuam depois das aulas acabarem e os pais chegarem do trabalho.
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Sempre achei que tanto tempo seria difícil para mim. Assumo. Creio que por características pessoais, porque ainda trabalho todos os dias e muito o que dá cansaço. Mas mais importante, porque o tempo em que estou com os netos estou com disponibilidade a 100%, deixando tudo o que poderia pensar do meu mundo pessoal ou fazer para outra altura.
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Para além de duas semanas, uma na Páscoa nas termas e outra no verão na praia, sou avó com presença em dia fixo, à 5ª feira. Nesse dia,  com a meta de me encontrar com eles, sinto que nos esperamos ansiosamente e é com entusiasmo que me recebem quando chego ao pátio da escola. "Avó Magda, vamos num petico? diz o Francisco que ainda fala assim do petisco, uns amendoins e sumo à beira mar. Mas nem sempre mete comida, e mais nos dias de chuva, brincamos muito e conversamos, até depois do jantar. Este é um momento importante e o Vicente fica desolado se por qualquer motivo não posso ficar.
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Mas hoje o dia foi diferente. Passado no Hospital Dona Estefânia onde o mais novo de 3 anos foi operado de urgência a uma apendicite. Espantoso, para além da clínica, sem valores analíticos muito alterados, sinais incipientes na Eco, as mãos experientes e seguras dos cirurgiões, perante a evolução de 12 horas não hesitaram "Está a começar, é uma apendicite e não há necessidade de esperar".
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5ª feira da avó Magda, bem diferente das habituais. 
Agora é esperar para podermos voltar às nossas brincadeiras.

sábado, 1 de junho de 2013

Aconteceu...1 de Junho de 1970, Dia Mundial da Criança

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Entrou em casa e bateu à porta do quarto. Na mão um embrulho de tamanho razoável. Olá, disse beijando-a, hoje é o Dia Mundial da Criança. Trago-te uma prenda. Estendeu o braço, ela agarrou. Era pesado e duro.
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Teria agradecido? Tinha sido surpreendida! E ambivalente. Aos 18 anos, ou se está completamente segura no seu crescimento ou o receber uma prenda do pai no Dia da Criança...
Estaria ele a dizer-lhe que, para ele, ela ainda era uma criança?

Pousou o embrulho na mesa de camilha e começou a rasgar o papel. Já tinha desconfiado que era um livro, estava habituada a adivinhar a prenda antes de abrir.
E lentamente o livro foi aparecendo e gravado na capa pode ler As Mulheres do Meu País. 
O livro que Maria Lamas escreveu em 1948!

Levantou-se rapidamente e foi à sala. No maple de orelhas, onde o pai se sentava sempre, lá estava ele, de olhos semiserrados. Ouvia Honegger. Um livro  sobre os joelhos. 

Sentiu-a a entrar e abriu os olhos. Sorriu. E ela, já descansada e orgulhosa, pode agradecer-lhe devidamente. 

sábado, 4 de maio de 2013

Aconteceu...a frieza dos portugueses da Europa

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Passear à beira mar em Ipanema ou Copacabana é também passar por vendedores de roupa de praia, bijouterie e outras coisas, que ocupam parte desses passeios largos com calçada portuguesa (1). 
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Passei por ali. Ia só e fui deitando um olho aos expositores colocados no chão. Parei várias vezes olhando com mais cuidado algum objecto que me chamou a atenção.
Foi o que aconteceu junto de um artesão de rastas castanhas e loiras que ali fazia as suas peças, colares, brincos, anéis. Sentado no chão, com um fio de metal e o alicate ia dando forma a uma espiral. Parei e olhei para o mostruário estendido sobre um pano. Do you speak english, perguntou. Português, respondi. Então esteja à vontade, pegue para ver melhor. Agradeci mas avisei que não ia comprar nada, estava só a ver por isso não ia mexer. Ele ficou um pouco irritado e perguntou porque nós, "os portugueses da Europa" éramos tão distantes, tão frios. Olhei-o surpreendido e ele continuou, que sendo ele o artista, não era só a venda que lhe interessava, mas também a apreciação do seu trabalho. Eu podia mexer, perguntar coisas como se faz, dar opinião, mas ficar só a olhar em silêncio era "muito frio dêmais". Que na verdade não nos interessava o seu trabalho.
Apanhada de surpresa, terei balbuciado duas ou três palavras, despedi-me e continuei o meu passeio sem "pegar" em nada. Mas a pensar no que ele me tinha dito.
Na volta passei outra vez junto dele, sorri-lhe e ele fez com a mão uma grande saudação e um rasgado sorriso, como se fossemos conhecidos de há longa data.
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Embu-das-Artes é uma pequena cidade do Estado de S. Paulo que todos os sábados é transformada numa grande venda de artesanato. Objectos feitos de madeira, barro, pele de peixe (!), tecido, cabaça, quadros, bijouterie e até jóias. Aqui não fui sozinha, acompanhou-me a minha prima Elisa, nascida em Portugal mas a viver no Brasil desde pequenina e a Ivone, uma amiga brasileira.
Vejo-as parar, comentar, mexer em muita coisa. Numa banca de jóias de prata com pedras brasileiras, pararam e a artesã que estava sentada levantou-se. A Elisa perguntou se era ela que fazia, qual o material usado, comentou coisas simples como "olha só este, quê bonitjinho"mas acrescentou que não ia comprar, estava só a admirar o trabalho. A senhora deu um grande sorriso, que isso não tinha importância, disse ela. Só dar umas palavrinhas já era bom, porque ali sozinha e calada durante horas era muito aborrecido. Posto que seguimos para outra.
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O ano passado expus umas peças de joalharia numa exposição realizada no meu antigo liceu, por altura do seu 60º aniversário. Praticamente não saí de perto do expositor, encostada à parede mais próxima. Muita gente passou e afastou-se sem uma palavra. Outras pararam, comentaram, algumas elogiaram. Só duas se interessaram pela eventual aquisição (nenhuma era para vender).
Esta experiência podia ter-me servido para saber como é agradável a atenção que dão ao nosso trabalho e os comentários, interessando-se pela técnica ou pelo design ou simplesmente entusiasmando-nos a continuar. Mas não,  por feitio reservado ou falta de empatia para com os outros artesãos, parece que tudo esqueci. Suponho que aquele "rastas" me ensinou muito mais que a experiência que eu já tinha vivido. 

(1)http://pedracalcada.blogspot.com.br/2008/12/ave-de-arribao.html