sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Poema - Ana Hatherly

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OS GUMES DA PALAVRA
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A fala
dá a conhecer
o ardor da palavra
o frio fio de seus gumes

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A palavra percorre o ar
entra em nosso peito docemente
ou então agudamente
ferindo
agredindo
destruindo tudo

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A palavra é
uma vertigem de espuma
mas quando quer
penetra a fractura íntima do sentir
desvenda o imenso mal
o puro escândalo de existir

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Aconteceu...rixa na praia, com agressão, por causa de uma bola. E já agora, pode-se ou não jogar à bola "devagarinho"?

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Ontem na praia de Vilamoura, na chamada Rocha Baixinha, uma bola de futebol veio parar perto do meu pé. Segurei-a e um homem jovem que jogava com um grupo de amigos veio buscá-la pedindo desculpa. Perguntei-lhe se podiam jogar ali, na parte concessionada, e ele disse que tinham ido perguntar ao banheiro que lhe teria dito que sim, mas "devagarinho". Ok, devagarinho disse eu, sorri e ele lá foi continuar a jogatana; houve várias bolas perdidas que, por acaso não acertaram em ninguém.

Jogar à bola remete-me sempre para a infância e adolescência dos meus filhos na praia do Sulférias - Manta Rôta, com um enorme areal e que tinha um banheiro nadador salva-vidas que era rigidíssimo e os chateava imenso, a eles e ao grupo de amigos que jogavam, mesmo que houvesse pouca gente e um enorme areal largo. Era o Xibalulo, nome que por eles foi baptizado, que "odiavam" mas respeitavam quando interpelados por ele.

Ontem li no jornal, que uns jovens jogavam à bola na praia da Quarteira, incomodando quase de propósito as pessoas. O concessionário foi-lhes chamar a atenção e acabou no chão pontapeado. Meteu muita gente, GNR, Polícia Marítima. O pai de um deles terá intervindo exigindo a devolução da bola, talvez apoiando também a sova que o homem, de mais de 60 anos estava a levar. A Polícia Marítima retirou para lugar sossegado os intervenientes e tomou nota da ocorrência e do nome deles.
No dia a seguir, o pai do jovem de 18 anos, principal causador, foi apresentar queixa no posto da polícia.

Associei esta situação com certos pais que vão às escolas bater aos professores que admoestaram os filhos, desautorizando o professor, situação mais frequente em crianças e jovens que apresentam alterações de comportamento. Mesmo que o filho tenha feito algo que quebra as regras instituídas, o desrespeito pela autoridade é assim transmitido aos filhos. E diga-se que estes miúdos não respeitam a autoridade parental, têm é medo deles.

E não é aos 18 anos, não se atinge a maioridade?

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Poema - Filipa Leal

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SE AO MENOS A MORTE
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Ela morria tantas vezes
em tiroteios à porta de casa
que já não sabia morrer para sempre
assim
de uma só vez.
Se ao menos marcasse um dia
para a morte, uma hora certa
como no dentista
que apesar de tudo nos faz esperar
onde apesar de tudo
não sabemos quando será a nossa vez.
Se ao menos a morte tivesse revistas
e gente na sala de espera
não estaríamos tão sós
tão vivos nessa ideia final
nesse desconforto.
Poríamos o nome na lista
quando estivéssemos prontos
sabendo que seria facil desmarcar
marcar para outro dia
ou simplesmente
não comparecer.
Depois, ficaríamos com a dor,
com o terror
de passar sequer naquela rua
como ela à porta de casa.
Ela que morria tantas vezes
porque morria de medo de morrer.

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Aconteceu...2666 de R. Bolano é um minúsculo livro de bolso quando comparado com o acordão do caso Casa Pia

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Peço desculpa se alguém já leu o post de hoje. De facto comecei a escrevê-lo ontem, e não estava pronto. Por nabice minha, em vez de o deixar gravado em rascunho deixei-o publicado. Como não era assim que o queria, retirei-o e vou postar a versão final.

Só este mês a leitura da sentença do processo Casa Pia foi adiada por duas vezes. Foi alegada falta de tempo para escrever o acórdão.
" A elaboração do acórdão "pressupõe a avaliação, a valoração e a decisão quanto à prova. E a prova está reunida em 66 mil páginas e 570 apensos, alguns dos quais com mais de dez volumes. O despacho de pronúncia tem cerca de 200 páginas e as contestações cerca de 1300" afirmou o Conselho Superior da Magistratura.

Na piscina, e debaixo de um pinheiro, uma senhora debatia-se com o 2666 do Roberto Bolãno, com que há meses me aventurei, faltando-me só um restinho, que por cansaço ficará para outra altura.
O 2666, constituído por 5 grandes capítulos, foi editado num só livro, por desejo da família, após morte do escritor. Na verdade são 5 livros que podiam ter sido editados em separado, embora haja elos de ligação entre eles. Centenas de crimes de morte sobre mulheres. Nunca se acusa ninguém de culpado.

O 2666, será um pequeno livro de bolso ao pé do citado acórdão.
Não sei de quem foi o interesse em que o processo Casa Pia fosse um único e não fossem realizados vários processos. Acredito que teria sido mais célere e a leitura das sentenças mais rápida.

E qual será o fim? Como acabará a história do processo da Casa Pia?